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O NAUFRÁGIO DO PAQUETE VICTORIA NO PONTAL

COLUNA Outros Quinhentos por Rogério Pinheiro

Os moradores do Pontal (bairro São Pedro), em Navegantes, testemunharam dois grandes naufrágios no passado. O primeiro e o mais famoso deles foi o paquete Pallas, em outubro de 1893. Na tarde do dia 18 de junho de 1906, uma segunda-feira, o paquete Victoria encalhou na entrada da barra do rio Itajaí-Açu depois de ser atingido por fortes ondas e quase virar. A história do naufrágio do paquete Victoria foi publicada no Jornal Novidades de 24 de junho de 1906 e em dezenas de outros periódicos no Brasil.

Naquela segunda-feira, o dia estava nublado e frio em Navegantes. Por volta das 16 horas, a notícia que um navio havia encalhado no Pontal se espalhou por Itajaí e Navegantes. Em poucos minutos, o Pontal se encheu de curiosos para ver o paquete Victoria, que ainda lutava com as ondas para entrar na barra. Da Praia do Pontal até uma distância de 150 metros para o mar havia um baixio (banco de areia). Foi nesse banco de areia que encalhou o Victoria. Naquela época não existiam ainda os molhes Norte (Navegantes) e Sul (Itajaí). 

Quem acompanhava o navio dos dois lados do rio, assistia à luta do comandante contra as grandes ondas que atingiam o paquete Victoria. Além disso, o navio dava grandes solavancos e parecia que viraria a qualquer momento. Todos testemunharam angustiados e já imaginavam as cenas de terror que os passageiros do paquete Victoria passavam naquele momento.

Chegaram no lugar do sinistro, no intuito de resgatar os passageiros, diversas embarcações a vela que prestavam serviços para outros navios como o paquete Rudi, o lugre Ramona, o escaler da Mesa de Rendas e dois botes da praticagem da barra. A embarcação do Rudi tentou se aproximar do paquete, mas as ondas eram tão grandes que fizeram o veleiro virar. Toda a tripulação se salvou depois de ser resgatada pelo escaler do Victoria.

O rebocador Ian, que fazia o serviço de melhoramentos da barra, passou um cabo no Victoria e tentou tirar o paquete do banco de areia. Após meia hora de trabalho, o cabo de aço não aguentou e quebrou. Na opinião dos tripulantes do Ian, que estava no momento muito próximo, o encalhe ocorreu devido à correnteza, ao mar agitado e, sobretudo, ao fato de o navio não obedecer ao leme.

Salvamento dos passageiros

Depois de várias tentativas frustradas de desencalhar o navio, o comandante do Victoria autorizou o desembarque dos passageiros, que até aquele momento estavam revoltados com o procedimento do comandante. As ondas haviam diminuído e isso facilitou a aproximação das embarcações de socorro. Eram 18 horas, quando os passageiros do Victoria começaram a sair do paquete. Além da escuridão e do frio, chovia torrencialmente.

Como a correnteza do rio Itajaí-Açu ainda estava muito forte, os passageiros foram resgatados e transportados em segurança até a praia do Pontal. O salvamento foi auxiliado por rapazes que carregavam no colo os passageiros até a areia da praia. No total, foram resgatados 26 passageiros, entre eles crianças, que saíram do navio apenas com a roupa do corpo. Por volta das 21 horas, o resgate terminou com o desembarque de toda a tripulação, que bastante cansada ficou na praia do Pontal, onde fizeram uma pequena refeição. Enquanto os passageiros foram hospedados em casas e hotéis de Itajaí, a tripulação passou a madrugada ao relento.

Ao amanhecer da terça-feira, dia 19 de junho de 1906, todos notaram que o navio estava a 183 metros da entrada da barra, em um lugar calmo e bem perto da praia. Sem perda de tempo, o rebocador Ian entregou-se novamente ao trabalho de desencalhar o navio. Na manhã do mesmo dia, o vapor Teixeirinha, que tinha vindo de Florianópolis, auxiliou o rebocador, mas também sem sucesso.

Tanto o rebocador Ian quanto o vapor Teixeirinha aguardaram pela maré alta para tentar tirar o navio do banco de areia. Até aquele momento, nenhum volume foi retirado do Victoria, que também transportava cereais. A bagagem dos passageiros permanecia no porão.

No dia seguinte, por volta das 15 horas, a maré atingiu seu pico. Mesmo assim, o paquete não se movia. O comandante mandou que despejasse ao mar sacos de feijão, farinha e arroz. A medida surtiu efeito e aos poucos o navio começou a se mover. Para a comemoração de todos que acompanhavam a cena, o Victoria enfim foi desencalhado e seguiu seu caminho no rio Itajaí-Açu até o ancoradouro.

Vapor Teixeirinha ajudou no desencalhe do paquete Victoria. Embarcação naufragou em junho de 1923. Crédito Maurício Carvalho 

Comandante acusou o prático de Navegantes pelo encalhe

Na quinta-feira, dia 21 de junho de 1906, o comandante do Victoria se apresentou ao suplente do juiz federal, Jorge Tzaschel. Durante o depoimento, ele atribuiu o encalhe do paquete à imperícia do prático Manoel Moreira Maia. Português de nascimento e morador de Navegantes, Maia disse que o encalhe se deu porque, apesar de ter recomendado que estivessem com a âncora pronta para ser arriada imediatamente ao primeiro pedido, o comandante só atendeu muito tempo depois quando não era mais possível suster o navio na sua tendência de ir ao encontro do banco de areia. 

Em entrevista para o jornal Novidades de 24 de junho, um passageiro do Victoria contou o que viu na tarde daquele dia 18 de junho de 1906.

“Eram 15h30, quando o Victoria chegou à barra. O prático estava no Pontal, em seu escaler, empunhando uma bandeira, com a qual fez diversos sinais ao vapor, para que este entrasse. O comandante, porém, recusou o convite, voltando a popa do navio para a barra e fazendo sinal ao prático para embarcar. Em vista daquela manobra, o prático resolveu dirigir-se para bordo e lá chegou às 16h25, assumindo imediatamente o seu posto e dirigindo o navio, a despeito da impetuosidade da ressaca, para a barra, um pouco ao norte, quase na direção do lugar onde se acha a caverna do Pallas, quando uma enorme vaga, apanhando-o por boreste (lado direito da embarcação), o atirou para a praia.”

O passageiro contou que todos a bordo entraram em pânico. Senhoras desmaiaram, crianças começaram a chorar e chefes de família a xingar a tripulação. Ele disse que ondas chegaram até o convés do navio. O passageiro relatou que ele e os outros reclamaram da demora em fazer o desembarque e apontou como heróis a tripulação dos barcos que fizeram o resgate. Ele culpou o comandante pelo encalhe.

O prático Manoel Moreira Maia foi inocentado. Todos que testemunharam a seu favor disseram que Maia era um homem muito cuidadoso com o seu serviço. Em junho de 1923, o vapor Teixeirinha que ajudou o paquete Victoria, naufragou no litoral do Rio Janeiro e seus restos permanecem lá até hoje.

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