Inicio o primeiro texto do ano, com um assunto que virou notícia nos últimos dias: o pedido de abertura de uma CPI contra o Padre Júlio Lancellotti, que além de absurda, é certamente descabida, e carece de justa causa.
A atitude do vereador Rubinho Nunes, parece ter o condão de perseguir aqueles que se propõem a auxiliar moradores de rua, aqueles que como o padre, tem o objetivo de prestar assistência e amparo as pessoas que estão à margem da sociedade.
O mencionado vereador já propôs restringir as doações aos moradores de rua, tendo como argumento que “distribuição irrestrita de alimentos para moradores de rua incentiva as pessoas a continuarem vivendo em meio ao lixo”.
Obviamente muitas pessoas compactuam e concordam com tal ideia, acreditam ser uma “opção” de muitos, morarem na rua, usarem drogas, não trabalharem, e viverem assim a esmo por que quiseram.
Na contramão a esse tipo de ‘entendimento” me pergunto, como alguém poderia fazer tal escolha, como alguém poderia conscientemente viver em meio a condições subumanas, degradantes, infernais. Antes de provavelmente terem sidos levados por uma “corrente” que os colocaram ali, na maioria dos casos, a escolha não existiu, a situação se impôs sobre a vida daquelas pobres pessoas, e que perderam inclusive esse caráter, de ser visto como alguém, como um ser humano.
É desagradável olhar alguém na condição descrita, por isso, é mais fácil ignorar ou até mesmo desprezar aqueles que “eu” não tenho como ideal, ou aqueles que não podem oferecer nada em troca para “mim” ou para a sociedade.
No caso do padre Lancellotti que trago a baila, o mesmo cumpre uma missão que é odiada por quem odeia também o pobre, odeia e rejeita atitudes que coloquem essa população em “destaque” nos jornais, ou ganhem “destaque” nos meios para serem percebidos.
A aporofobia é isso: aversão, medo, desprezo ou rejeição aos pobres, e que segue enraizada e disseminada no nosso meio, (mesmo que quase ninguém conheça seu significado), praticamente de mãos dadas com outros preconceitos e discriminações.
Como preleciona Adela Cortina: ” …quem não tem nada a oferecer em termos práticos – como seria o caso da população em situação de rua, por exemplo – é instintivamente deixado de lado”.
Assim seguimos, “condenamos” alguém que deveria ser aclamado, por ser símbolo de altruísmo, dedicação, solidariedade, por oferecer abrigo, alimentação, assistência, para aqueles que foram esquecidos, marginalizados e desumanizados pelo sistema e pela maioria.
No Brasil temos distinções patéticas entre as pessoas, em que algumas são menosprezadas por não possuírem determinados bens, enquanto outros são quase endeusados por seus status, quase como em “o capote ” de Gogol, para serem vistos, precisam de um capote novo.