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O ACIDENTE DO PAQUETE PALLAS NO RIO ITAJAÍ

Naufrágio do Pallas na foz do rio Itajaí-Açu, em 1893, nunca foi explicado e uma das hipóteses é que a colisão nas pedras foi proposital

Por Rogério Pinheiro

No dia 15 de agosto de 2017, uma draga de pequeno porte que fazia os serviços de sucção e recalque na Bacia de Evolução do rio Itajaí-Açu tocou em restos de madeira e aço que poderiam ser de um navio. Depois de um ano de investigação, a Autoridade Portuária e a Superintendência do Porto de Itajaí concluíram que o navio era o paquete frigorífico Pallas, encalhado no rio Itajaí-Açu em 1893. A história do paquete Pallas é o tema da coluna desta semana.

O paquete (navio multifuncional para passageiros, cargas e correios) foi construído pela Hawthorn Leslie and Company. A empresa foi formada pela fusão do estaleiro A. Leslie and Company com o fabricante de locomotivas R and W. Hawthorn em Newcastle (Inglaterra), em 1886. O estaleiro ficava também na margem de um rio, o Tyne, cuja foz é em Newcastle.

Planta do paquete. Construído na Inglaterra, navio movido a vapor era um dos mais modernos da época
Crédito: Tyne & Wear Archives

 O navio a vapor foi encomendado pela Companhia Frigorífica e Pastoril Brasileira e entregue em 16 de dezembro de 1891. No ano seguinte, o paquete já transportava passageiros e carga frigorificada de Buenos Aires ao Rio de Janeiro. Na época, a Argentina tinha um dos maiores rebanhos bovinos do mundo.

Com 67 metros de comprimento, o paquete era o menor das seis embarcações da Companhia Frigorífica e considerado o mais moderno da frota. Tinha capacidade para transportar até 500 toneladas de carga frigorificada e possuía um gerador de energia. No dia 21 de dezembro de 1892, o Jornal Gazeta de Notícias (RJ) publicou uma reportagem sobre o navio que começava a fazer a linha Rio/Buenos Aires.

“O paquete Pallas, um dos seis que a companhia possui, é o menor em tamanho, de elegante e sólida construção. Com capacidade para transportar número superior a mil rezes mortas, bois, carneiros, porcos, aves e frutas; além de outro gênero de carga e passageiro.” 

O mesmo jornal destacava a sua construção, que poderia navegar até por rios de baixo calado. 

Cidade de Newcastle, Inglaterra, em 1887, onde o Pallas foi construído em 1891
Crédito: Thomas-SulmanTM

“A sua construção e tal, que seu calado presta-se a entrada na barra do Rio Grande e navegação nos rios e lagoas do mesmo até Porto Alegre”.

Na mesma reportagem, o periódico carioca publicou detalhes da câmara frigorífica do paquete e também que a embarcação possuía luz elétrica, um avanço tecnológico para a época.

“Examinamos sua câmara frigorífica e verificamos ser a temperatura na ocasião de oito graus abaixo de zero. Essa temperatura pode ser mais baixa ou elevada, conforme as exigências de ocasião ou de gênero que o paquete transporta. Os mecanismos para produção do frio, do vapor necessário para a marcha do paquete e para produção de luz elétrica são os mais aperfeiçoados e seguros”.

Revolta da Armada

Depois que o Marechal Deodoro da Fonseca renunciou a presidência da República, coube ao seu vice Floriano Peixoto, assumir o comando do país. Floriano fechou o Congresso Nacional e decretou estado de sítio. Oficiais da Marinha não concordaram com a medida e pediram que Floriano obedecesse à constituição de 1891 e convocasse eleições diretas. 

A Revolta da Armada começou no dia 6 de setembro de 1893, na baia da Guanabara, liderada por oficiais superiores da armada Saldanha da Gama e Custódio de Melo. Ainda em setembro de 1893, os revoltosos apoderaram-se de 15 navios mercantes, entre eles o Pallas.

O objetivo dos marinheiros era tomar o Porto de Santos, mas a resistência dos santistas fez com que o alvo fosse a Ilha de Santa Catarina. Os rebeldes desembarcaram em Desterro (Florianópolis) no dia 2 de outubro de 1893, onde tentaram se aliar com os gaúchos partidários do federalismo, porém sem sucesso.

O acidente

Na noite de 25 de outubro de 1893, o Pallas entrou no Porto de Itajaí para um desembarque não previsto. Naquela noite o tempo estava bom e as condições de navegação ótimas. Apesar de ser um navio construído para navegar em rios, o Pallas bateu em rochas na entrada da barra do rio Itajaí e em seguida foi encalhado propositalmente para evitar o afundamento. 

O acidente nunca foi explicado e nem uma investigação aprofundada foi feita por parte da Marinha. Já a seguradora do navio considerou o acidente anormal para as condições de mar e de visibilidade relatados.

Reconstituição do casco do Pallas mostra que navio se encontra hoje partido ao meio
Crédito: Sulmar 

Uma das hipóteses levantadas para explicar a colisão, é que a ordem para o encalhe foi dada pela Companhia Frigorífica, que passava por dificuldades financeiras e precisava do dinheiro do seguro. Além do Pallas, a companhia havia perdido outros navios na Revolta da Armada.

Toda a tripulação do Pallas conseguiu se salvar e os marinheiros rebeldes que tomaram o paquete foram anistiados. Muitos deles permaneceram em silêncio para evitar represálias.

Depois do encalhe, a carga de carne e peças de maior valor foram retiradas. Em 17 de novembro de 1893, o navio foi colocado à venda em um leilão. Sem interessados, o paquete Pallas acabou abandonado. Com a notícia do encalhe, o navio foi alvo de saqueadores. Depois de 50 anos, o Pallas ficou totalmente submerso.

Proa do Pallas. Navio se encontra em lugar com pouca visibilidade devido ao fundo lamacento do Rio Itajaí Açú.
Crédito: Sulmar 

O paquete Pallas naufragou na parte interna da foz do rio Itajaí-Açu, no molhe norte. A área tem pouca visibilidade devido ao fundo lamacento, água contaminada, correntes e intenso fluxo de navios.

 Imagens captadas por mergulhadores da empresa Sulmar, mostram que o navio se encontra hoje partido ao meio, afastados cerca de 40 metros uma parte da outra. Do Tyne, onde nasceu em 1891, o Pallas descansa há quase 130 anos na foz de outro rio, o Itajaí-Açu.


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