COLUNA: Outros Quinhentos, por Rogério Pinheiro
Em 2023, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Receita de Navegantes lançou a campanha “Navegantes, a cidade do futuro”. A campanha publicitária mostrava os incentivos fiscais que ajudaram a abertura de novas empresas e as conquistas da atual administração municipal. Apesar do visual moderno, o slogan “Navegantes, a cidade do futuro” faz parte do passado do município. Ele começou a ser usado assim que Navegantes deixou de ser um bairro de Itajaí em 1962.
Quatro anos depois da emancipação, Navegantes continuava do mesmo jeito que começou, praticamente sem recursos para investimentos. O Governo do Estado não repassava nada para o município. As contas básicas eram pagas graças ao dinheiro enviado pelo Governo Federal e algumas receitas geradas pelo município. O prefeito Cirino Adolfo Cabral chegou a reclamar da falta de ajuda por parte do Governo do Estado.
“Não se pode administrar quando não se possui meios financeiros. O município de Navegantes está até esta data (10/02/1966) sem recursos. Está se mantendo com as pequenas rendas e a ajuda do Governo Federal. É lamentável que o Estado não tenha realizado.”
Para ter uma ideia do atraso que se encontrava em 1966, Navegantes não tinha agência bancária, correios, hospital e linhas telefônicas. Boa parte da cidade vivia às escuras e muitas casas eram iluminadas por lampiões, lamparinas ou mesmo velas. O município ainda não tinha empresas e o comércio não existia, dependendo dos itens básicos comprados no comércio de Itajaí. Faltava até mesmo uma identidade, já que o novo município foi por muitos anos chamado de Itajaí.
Mas antes de pensar no futuro, o novo município precisava fazer obras emergenciais, algumas delas agravadas por um temporal de verão que atingiu Navegantes no começo de janeiro de 1967. Entre as obras emergenciais estavam a reconstrução da ponte do ribeirão Koeller, destruída por uma forte chuva de dezembro de 1966. A ponte localizada no bairro São Domingos era importante na época. Sem a ponte, para chegar até os bairros Machados e Escalvados, por exemplo, era preciso seguir por Itajaí. Para evitar esse percurso de 30 quilômetros, a prefeitura construiu uma ponte improvisada.
Outra obra urgente era a reforma da escola estadual Júlia Miranda de Souza, que precisava de reparos em seus banheiros, a construção de muros e de um ginásio federal anexo à escola. O ginásio correspondia a 5ª série do ensino fundamental hoje. Na época, a escola Júlia Miranda de Souza oferecia apenas as quatro primeiras séries do ensino fundamental. Depois da quarta série, o aluno teria que procurar uma escola de Itajaí para continuar seus estudos.
Além dessas obras essenciais na principal escola do município, Navegantes necessitava também de um caminhão e uma carregadeira para auxiliar nas obras de reconstrução. Os veículos foram solicitados por empréstimo ao Governo do Estado, que se comprometeu na época em atender os pedidos realizados pela Prefeitura de Navegantes.
Aos poucos, os pedidos foram atendidos. Ainda em 1966, a Centrais Elétricas de Santa Catarina (Celesc) instalou os novos postes de iluminação pública e começou a fornecer energia elétrica para as residências. Outra reivindicação era a agência dos correios, que se arrastava a sua instalação na cidade desde da emancipação em 1962. Também de promessas não cumpridas estava o serviço telefônico. Em 1966, Navegantes não possuía uma linha telefônica.
Outro entrave para desenvolvimento de Navegantes dizia respeito à falta de uma agência bancária no município. Havia até uma negociação para trazer o banco itajaiense Inco, um dos maiores de Santa Catarina, para Navegantes. No entanto, o banco Inco faliu e o projeto não foi para frente. Os navegantinos tiveram que esperar até a década de 1980 para ter um banco na cidade, no caso a agência do antigo Banco do Estado de Santa Catarina (Besc).
Para ser a cidade do futuro, Navegantes precisava ainda atrair empresas. O município começou a oferecer terrenos quase de graça e isenção de impostos para novos empreendimentos. A grande aposta para o desenvolvimento econômico estava na vocação pesqueira. Em 1967, foi inaugurada a Sociedade Industrial Pesqueira (SIP), que prometia ser uma das maiores do setor pesqueiro do Brasil. Mesmo tendo entre os acionistas a Johnson & Johnson e Volkswagen, a SIP ficou só na promessa.
Disputa entre os acionistas pelo controle da empresa, a falta de salas de manipulação e principalmente a ausência de uma frota pesqueira própria foram alguns dos problemas que contribuíram para a falência da SIP em 1974. Em 1975, o empresário Orlando Ferreira, proprietário de uma empresa de pesca em Itajaí, arrematou em um leilão judicial o parque industrial e transferiu a Ferreira Mercado de Pescados (Femepe) para Navegantes. A Femepe foi por muitos anos a empresa que mais empregava no município, mas insuficiente para atender as aspirações futuristas de Navegantes.
Plano Diretor
Para ser a cidade do futuro, Navegantes precisava se planejar e para isso foi criado um Plano Diretor, que começou a ser discutido em 1968. O plano abrangia toda a área urbana, dividindo-a em 52 superquadras e outras 1.872 quadras. Os 30 mil lotes previstos pelo Plano Diretor seriam divididos em zonas industriais, escolares, de recreio, artesanato, centros cívicos, zona comercial e residencial. Foram traçadas ainda cinco avenidas com 32 metros de largura, duas pistas e jardinagem no Centro. As ruas que ligavam as quadras teriam 10 metros de largura.
O Plano Diretor também reservou para o setor industrial algumas vantagens. Entre elas, a facilitação para a aquisição de terrenos e isenção de impostos durante um prazo de cinco anos. Como contrapartida, a empresa seria obrigada a contratar apenas moradores de Navegantes. No planejamento econômico do município estava a construção de uma rodovia para ligar Navegantes a Blumenau.
A rodovia era tratada como prioridade pelo município, já que ajudaria o escoamento da produção de Navegantes e ligaria o Vale do Itajaí com a região Oeste de Santa Catarina. A rodovia começou a ser projetada em 1973, mas sua construção só começou na década de 1980 e foi inaugurada nos anos 90. A rodovia recebeu o nome de BR-470.
Os anos passaram e muitas metas do plano projetado para ser a cidade do futuro não foram cumpridas. Aprovado em 1968, o Plano Diretor de Navegantes não tinha saído do papel até 1974 e a história mostrou que ele nunca seria executado. Mesmo com os incentivos fiscais, poucas empresas se interessaram em se instalar em Navegantes. A economia da cidade estava concentrada na pesca, que sofria com as oscilações na produção de pescados e de mercado.
“Navegantes, a cidade do futuro”, com o tempo, ficou no passado e retornou com a instalação da Portonave em 2007. Hoje, o município vislumbra um nível de desenvolvimento que começou a ser sonhado na década de 1960. Só o tempo vai dizer se Navegantes é a cidade do futuro.
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