Em 1974, objeto voador não identificado trouxe uma multidão para o município
COLUNA: Outros Quinhentos, por Rogério Pinheiro
Na tarde do dia 2 de julho de 1974, uma terça-feira, moradores do bairro Gravatá observaram um estranho objeto em forma de disco se deslocar no ar. Segundo testemunhas, ele era branco, não tinha asas e não emitia som. O Objeto Voador Não Identificado (OVNI) voou por alguns segundos até cair no mar a 100 metros da praia. Depois de 50 anos, a coluna “Outros quinhentos” conta a história do misterioso objeto que assustou Navegantes e foi capa de jornais do Brasil inteiro.
Na tarde daquela terça-feira, por volta das 14h, o pescador Humberto Generoso passeava pela praia com a família, quando avistou um objeto de cor branca ofuscante, que deslocava do mar a uma velocidade aproximada de 50 km/h. O objeto parecia ter cerca de 8 metros de diâmetro por 3 de altura. Segundo Generoso, o voo foi interrompido e o objeto começou a baixar até atingir o mar, onde boiou por cerca de 5 minutos antes de afundar.
Humberto acreditou que o objeto fosse uma aeronave. Ele foi até seu rancho e pegou uma canoa para prestar os primeiros socorros. Ao chegar no local da queda, o “disco” já tinha submergido. O pescador retornou para a praia, que já começava atrair mais pessoas. Além de Humberto, outros moradores do Gravatá também testemunharam a queda do objeto voador não identificado naquela tarde.
Assim que a notícia se espalhou, uma romaria de curiosos seguiu para o Gravatá. Centenas de pessoas de várias cidades de Santa Catarina correram para Navegantes para ver o “disco voador”, segundo o jornal “Diário de Pernambuco”, edição de 11 de julho de 1974.
“A cidade de Navegantes, a 100 quilômetros desta capital (Florianópolis), está atraindo centenas de curiosos procedentes de diversos pontos do Estado, com a notícia de um disco voador que teria caído naquele município. As autoridades já foram notificadas do fato e algumas revelaram que estão sendo tomadas providências.”
Outra testemunha citada pelo “Diário de Pernambuco” foi Alfredo Leopoldo Costa, 51 anos, que confirmou que o objeto voava a baixa altura e brilhava muito. O jornal também mencionou a tentativa de várias pessoas em recuperar destroços do “disco”. Uma delas foi o mergulhador de Balneário Camboriú, Celso Lehmkuhl, que na época era famoso na região.
O pescador Umbelino Severino afirmou ter encontrado apenas uma leve espuma na superfície da água. Contou também que, à medida que remava seu barco em direção ao local da queda, notou que o estranho aparelho afundava. José Custódio, ex-marinheiro, lembrou que não teve coragem de mergulhar à procura. A Capitania dos Portos de Itajaí chegou a sinalizar o local da queda com boias, que logo foram retiradas.
Dias depois do avistamento, um pescador levou um pedaço de metal do suposto “objeto voador não identificado” ao jornal Correio. A Marinha abriu uma investigação, ouviu as testemunhas e começou as buscas pelo aparelho. No dia 12 de julho, a Marinha suspendeu as buscas ao objeto não identificado. A informação é do jornal “O Estado”, de 13 de julho de 1974.
“Por ordem de autoridades da Marinha, foram suspensas as buscas ao objeto não identificado, ou disco voador, que teria caído na praia do Gravatá, em Navegantes, e afundou em seguida.”
O jornal destacou na reportagem que a procura de curiosos havia diminuído bastante.
“Embora continuem as afirmações de alguns pescadores, de que teriam avistado um objeto prateado em forma de disco, surgir misteriosamente do espaço, pairar alguns segundos sobre as águas para logo submergir, os comentários e o número de curiosos diminuiu consideravelmente naquela localidade.”
Além de suspender as buscas, a Marinha proibiu que os pescadores procurassem o objeto por conta própria.
“Para ontem estava anunciado que duas baleeiras, arrastando uma rede de cerca de 250 metros, tentariam encontrar o tal objeto voador. Entretanto, autoridades da Marinha estiveram no local e proibiram este trabalho de busca, bem como dos mergulhadores que já há dois dias estavam agindo no local.”
A Capitania dos Portos de Itajaí também investigou o incidente, mas não fez nenhum pronunciamento oficial. A Marinha do Brasil anunciou que investigaria o caso e a notícia foi capa até da “Folha de São Paulo”, de 5 de julho de 1974. Apesar do anúncio, o resultado da investigação nunca foi divulgado.
No dia 22 de maio de 2012, foi oficializado um pedido de acesso à informação dirigido ao Ministério da Defesa/Comando do Exército sobre o avistamento de OVNI em Navegantes, na data de 02 de julho de 1974. Em resposta enviada no dia 11 de junho daquele ano, o Ministério da Defesa/Comando do Exército negou ter conhecimento de algum relatório a respeito do assunto.
“O Centro de Inteligência do Exército (CIE) não possui em seus arquivos, informações ou relatórios de investigações com coleta de moradores da Praia de Navegantes/SC, sobre o caso de Objeto Voador Não Identificado (OVNI), entre 14h e 15h30, do dia 2 de julho de 1974.”
Queda de objeto pode ter ligação com anomalia atmosférica
No dia 1º de maio de 1974, o Jornal do Povo informou que um satélite russo havia detectado uma irregularidade na atmosfera da região e que alguns cientistas, entre eles um inglês e o major do Ministério da Aeronáutica, o engenheiro eletrônico, Edsel de Freitas Coutinho, já estavam em Itajaí. O jornal também anunciou que o Ministério da Aeronáutica estudava a instalação de uma base de lançamento de foguetes no litoral de Santa Catarina.
A irregularidade citada pelo Jornal do Povo é a anomalia do campo magnético da Terra que fica sobre o Sul do Brasil e que em 1974 tinha seu centro em Navegantes. Chamado oficialmente de Anomalia do Atlântico Sul (Amas), o fenômeno é estudado por cientistas russos e norte-americanos desde da década de 1960.
O campo magnético da Terra funciona como um escudo ao redor do planeta que repele partículas carregadas do Sol, como radiação cósmica e ventos solares. No entanto, sobre o Sul do Brasil, existe uma região em que esse campo é enfraquecido. Nesta área, a radiação de partículas, principalmente de elétrons, pode derrubar os computadores de bordo e interferir na coleta de dados dos satélites que passam por ela. Foi o que aconteceu com o satélite russo ao passar pela região na década de 1960.
O primeiro acordo de cooperação entre Brasil e Estados Unidos para o estudo da anomalia aconteceu em 1968. Naquele ano, cientistas brasileiros e norte-americanos se reuniram no Centro Espacial de Houston para o lançamento do primeiro foguete, que foi realizado no dia 10 de junho de 1968. O foguete levou uma cápsula contendo os instrumentos de pesquisa que atravessou o cinturão de radiação e caiu em seguida no oceano Atlântico.
O projeto de cooperação internacional foi chamado de “investigação da anomalia do Atlântico Sul”. Na época, os estudos seriam usados para proteção dos astronautas em missões de altitude relativamente baixas, perto dos cinturões de radiação.
Apesar do anúncio e das várias visitas do major Edsel à região, o projeto para instalação da base de foguetes nunca saiu do papel. Sobre o objeto que caiu em Navegantes, uma possibilidade levantada na época era que fosse um balão meteorológico, um satélite russo ou norte-americano, confundido pelos pescadores do Gravatá com um “disco voador”. Sem a confirmação da Marinha, que investigou o caso, o mistério ainda persiste 50 anos depois e provavelmente continuará nos próximos 50 anos.