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A CIDADE PAULISTA QUE ADOTOU NAVEGANTES NA ENCHENTE DE 1983

FOTO: Enchente de 1983 deixou 3 mil desabrigados em Navegantes. Na foto, Blumenau registrou 50 mil desabrigados. Crédito: Fundação Cultural de Blumenau/Arquivo Histórico José Ferreira da Silva)

Em julho de 1983, Santa Catarina foi atingida por uma grande enchente. O nível do rio Itajaí-Açu chegou à marca de 15,34 metros. Dezenas de municípios decretaram estado de calamidade pública. Milhares de pessoas ficaram isoladas, sem eletricidade, comida e água. A tragédia deixou aproximadamente 200 mil desabrigados e 49 mortes, segundo a Defesa Civil de Santa Catarina.

Em Navegantes, três mil pessoas ficaram desabrigadas. Os bairros Machados e Porto Escalvado foram os mais afetados pelas cheias. Em 1983, o município sobrevivia da pesca e agricultura. A Prefeitura de Navegantes não tinha recursos, caminhões ou máquinas para reconstruir estradas e ruas. Os prejuízos calculados chegaram a mais da metade do orçamento da cidade, que era de 335 milhões de cruzeiros.

No meio da tragédia, uma corrente de solidariedade atravessou o país. Centenas de cidades brasileiras se mobilizaram para ajudar os desabrigados. No Estado de São Paulo, o governador Franco Montoro criou o Programa “Cidades Solidárias”, onde um município paulista adotaria uma cidade catarinense. Santos adotou Itajaí e a cidade vizinha São Vicente escolheu Navegantes.

Na década de 1970 e começo dos anos 80, muitas famílias do litoral catarinense moravam na Baixada Santista, principalmente em Guarujá e Santos. A maioria dos pescadores empregados nas empresas pesqueiras de Santos, por exemplo, eram de Santa Catarina e entre eles muitos navegantinos.

Comandada pelo prefeito Sebastião Ribeiro da Silva, a campanha “SOS Navegantes” mobilizou toda a cidade de São Vicente. Cada morador ajudou na doação de alimentos e medicamentos para os desabrigados de Navegantes. Além dos moradores, entidades, empresas de São Vicente e o setor pesqueiro da Baixada Santista aderiram à campanha.

Mobilização para ajudar Navegantes

Lions Club, Cruz Vermelha, União Cívica Feminina e Corpo de Bombeiros também ajudaram. Metalúrgicos da antiga Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa), em Cubatão, fizeram uma campanha para arrecadar roupas, cobertores, agasalhos, colchões e gêneros não perecíveis. Dezenas de motociclistas se mobilizaram e percorreram as ruas de São Vicente, Santos e Guarujá para coletar doações. Junto com um caminhão, os motociclistas recolheram roupas, agasalhos, sapatos, alimentos e cobertores.

Até mesmo os taxistas não ficaram de fora. Cerca de 50 taxistas colaram adesivos em seus veículos com a frase “SOS Região Sul” para arrecadar doações para os desabrigados. Os taxistas circularam pelas cidades de São Vicente e Santos em busca de qualquer tipo de donativo, que era entregue na Central do Corpo de Bombeiros. A Associação Comercial de Santos (ACS), arrecadou 7 toneladas de café torrado e moído. Mais de 20 empresas cafeeiras atenderam ao chamado da campanha iniciada pela ACS. O café foi distribuído também em Navegantes.

Mobilização para ajudar Navegantes foi notícia nos jornais de Santos. Crédito: Jornal Cidade de Santos/Reprodução

Setor pesqueiro

Um dos setores da economia da Baixada Santista que ajudou bastante os desabrigados foi a pesca. A informação é do jornal Cidade de Santos, edição de 15 de julho de 1983.

“Cibrazem, Associação de Armadores, Cooperativas Pesqueiras e usuários do Terminal Pesqueiro de Santos, de forma geral, estão empenhados na arrecadação de todo tipo de doação para encaminhamento ao Sul do país. O grande empenho da classe pesqueira se justifica, inclusive, pelo fato de manterem contato direto com aquelas populações, sentindo de perto a gravidade da situação. Segundo o presidente da Associação Profissional de Armadores de Pesca do Estado de São Paulo, Huston Aluízio da Costa, boa parte dos tripulantes da frota paulista tem familiares em Santa Catarina. Ainda ontem (quarta-feira), saíram do píer do terminal santista, três embarcações com gêneros alimentícios e agasalhos, para promover algumas famílias de pescadores que estão passando necessidade.”

A mesma edição do jornal confirmou o envio dos donativos para Navegantes.

“O setor pesqueiro regional está empenhado na campanha em prol dos flagelados de Santa Catarina, tanto que ao meio-dia de ontem partiu do Terminal Pesqueiro de Santos um caminhão com agasalhos e alimentos, em direção à Prefeitura de Navegantes, em Santa Catarina.”

SOS Navegantes

Segundo o jornal da Cidade de Santos, de 2 de agosto de 1983, a situação de Navegantes era crítica.

“O pequeno município de Santa Catarina estava praticamente sem nada, contava apenas com alguns alimentos enviados pelo Governo Estadual, o que tornava impossível o atendimento aos 3 mil desabrigados. O prefeito Domingos Angelino Régis afirmou que a ajuda de São Vicente foi fundamental. Já que a situação continua crítica, tanto assim que as pessoas que tinham retornado para suas casas e começavam a reconstruir uma nova vida, voltaram aos abrigos da prefeitura, pois novamente, com as últimas chuvas, o rio transbordou, levando medo e desespero à população ribeirinha, principalmente dos bairros Machados e Porto Escalvado.”

A mesma edição do jornal santista citou o valor do prejuízo calculado pela Prefeitura de Navegantes.

“Solidários com a trágica situação de Navegantes, que não possui rede de esgoto, somente uma das ruas é calçada, e com um orçamento de 335 milhões, quando o prejuízo já ultrapassa os 200 milhões de cruzeiros, São Vicente vai continuar na campanha pela reconstrução de Navegantes, auxiliando no atendimento às vítimas do flagelo das chuvas”

Mais de 10 toneladas de doações

As primeiras toneladas de alimentos, roupas e medicamentos arrecadados na campanha SOS Navegantes foram enviadas no dia 30 de julho de 1983, conforme noticiou o jornal Cidade de Santos, de 2 de agosto de 1983.

“Contando com a participação de todos os setores da comunidade vicentina, a campanha conseguiu mobilizar a opinião pública que contribuiu para arrecadação de mais de 10 toneladas de roupas e alimentos, cerca de 5 mil caixas de remédios, desde antigripal, injeções e antibióticos, além de móveis, colchões e material para construção.

A caravana do SOS Navegantes partiu na madrugada composta de 2 caminhões da prefeitura que foram acompanhados pelo chefe de gabinete, Miguel Pasquarelli Filho, representando o prefeito, e o secretário de Turismo, Heitor Ferreira, que representou o presidente da Câmara, Natividade Nolasco de Omena.

Além dos dois caminhões da prefeitura, outro gentilmente cedido pela Akama, Comércio de Pescados, partiu ontem com mais roupas, mantimentos e remédios, completando assim a primeira fase do SOS Navegantes.”


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